Uma das principais consequências da crise econômica causada pela pandemia foi o aumento do número de pessoas em situação de rua na cidade do Rio de Janeiro. Por isso, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Municipal do Rio promoveu uma audiência pública na tarde desta sexta (19) para discutir que ações o poder público está empreendendo para atender essas pessoas em situação de vulnerabilidade. A reunião híbrida, que aconteceu no Plenário, contou com a presença de parlamentares, representantes do Poder Executivo, de associações de moradores e de entidades que lutam em prol da população em situação de rua.
Presidente da Comissão de Direitos Humanos, a vereadora Teresa Bergher abriu a reunião com um questionamento à metodologia usada no Censo de População em Situação de Rua feito em 2020. Para ela, basta andar pela cidade que é possível perceber que este número de 7 mil pessoas apontado no estudo está subestimado. “A realidade que nós vemos nas ruas do Rio de Janeiro hoje ultrapassa bastante esses números.”
Vice-presidente do colegiado, o vereador Alexandre Isquierdo (DEM) concordou com a percepção de Teresa Bergher e cobrou informações do poder público sobre o tema. “A gente precisa ter os dados da Prefeitura e conhecer os projetos que a nova gestão tem. Foi registrado um grande aumento da população de rua, isso é notório. Basta você andar pela cidade. Há uns anos atrás era muito local, era mais no Centro, Copacabana, e hoje em qualquer bairro da cidade você encontra pessoas morando debaixo de marquises. Então, há um alerta. Nós precisamos ajudar essas pessoas”, declarou o parlamentar.
Os participantes da audiência pública enumeraram variados temas fundamentais para diminuir o número de pessoas em situação de rua na cidade, como desemprego, dependência química, falta de moradia adequada e insegurança alimentar. A secretária municipal de Assistência Social, Laura Carneiro, falou sobre o que está sendo feito para enfrentar esses desafios atualmente. “Existe uma política pública nacional, essa é uma legislação que nós temos que cumprir do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional de Assistência Social. E o que nós temos feito? Aumentamos as equipes, estamos reformulando o sistema que nos permitem, o da criança e do adolescente”, citou Carneiro.
A expectativa é de mais investimentos na Secretaria de Assistência Social. De acordo com o Poder Executivo, para 2022, o orçamento da pasta deverá ser de R$ 591 milhões, uma ampliação de cerca de 26% em relação aos valores de 2021, contabilizados em R$ 434 milhões. Os dados foram trazidos em um das audiências públicas realizadas na Câmara do Rio para tratar da Lei Orçamentária Anual para o exercício financeiro de 2022 (Projeto de Lei nº 744/2021) e do Plano Plurianual para o quadriênio 2022-2025 (Projeto de Lei nº 628/2021). A estimativa é que sejam criadas, até 2024, mais 3 mil novas vagas de abrigamento. Somente em 2022 serão 600 vagas.
No entanto, a representante da Coordenação do Movimento Nacional de População em Situação de Rua, Elicarla Maria Álvares, discorda que a criação de vagas em abrigos seja uma boa solução. Ela viveu em situação de rua durante sete anos e sugere um projeto específico que já funciona em outras cidades do Brasil e do mundo. “A moradia assistida funciona assim: você vai pegar um prédio de cinco andares, que serão reformados. Lá, terão assistentes sociais, consultório, você vai ter empregabilidade e a moradia necessária por cinco anos. Nesse período, a pessoa faz um tratamento, vai ter toda a sua documentação e sai dali empregado. Durante cinco anos a pessoa vive ali. Esse projeto existe em São Paulo, Cuiabá, no Rio Grande do Sul e até em Londres, onde essa iniciativa começou. É melhor do que abrigo”, ressaltou.
Para Luiz Carlos Santos, integrante da Associação de Moradores do Humaitá, a solução pode estar nos vários imóveis vazios no município. “Acho que a Câmara precisa votar um orçamento adequado às necessidades de toda população em situação de rua. Nós estamos aqui realmente para resolver e dar sugestões. Nós temos mais de 30 mil imóveis no Rio de Janeiro que poderiam ser utilizados como hotel de habitação para justamente acolher essas pessoas que são humanas e merecem respeito. Tem que dar toda a assistência necessária.”
Eliane Pereira foi uma das participantes da audiência pública. Ela é coordenadora de Direitos Humanos e de Minorias do Ministério Público, uma estrutura nova dentro do órgão. Pereira refletiu sobre a complexidade de se tratar a questão da população em situação de rua e o papel do próprio Ministério Público.“A questão da população em situação de rua é muito ilustrativa porque a gente percebe aspectos relacionados ao trabalho e renda, à saúde mental, à precariedade de uma boa política de acesso à documentação básica, gente encontra na população de rua um percentual expressivo de pessoas que são consideradas desaparecidas. Enfim, essa população em situação de rua é quase que um demonstrativo de todos os indicadores que a gente precisa cuidar em termos de política pública. Mas é muito bom que a gente diga aqui que o Ministério Público não elabora e nem executa política pública, mas ele fomenta a política pública.”
A vereadora Teresa Bergher adiantou quais serão as próximas ações tomadas pela Comissão. “Os próximos passos serão aprofundar ainda mais o debate e a sugestão de propostas aos colegas vereadores para que se coloque mais verba no orçamento a fim de atender a Assistência Social. Além disso, vamos pressionar o prefeito para reabrir os seis restaurantes populares porque isso já vai dar um certo alívio para combater a miséria e a fome de muitas pessoas”, apontou a presidente.
Ainda participaram da audiência pública os vereadores Gabriel Monteiro (PSD), vogal da Comissão de Direitos Humanos; Reimont (PT); Dr. Rogério Amorim (PSL) e Paulo Pinheiro (PSOL). Também estavam presentes a coordenadora geral de Promoção de Dignidade da Pessoa Humana do Ministério Público, Patrícia Carvão; a subsecretária de Proteção Social Especial da SMAS, Sheila Oliveira; Valéria Dantas, representante da Secretaria Municipal de Saúde; membros de associações de moradores de bairros da Zona Sul e Zona Norte; entre outros.