As mudanças urbanísticas no bairro do Cosme Velho, na Zona Sul, ponto de partida para o principal ponto turístico do Brasil, o Cristo Redentor, foram tema de uma audiência pública da Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal do Rio na última quinta-feira (08). Na reunião, vereadores, representantes da Prefeitura e moradores da região discutiram os impactos no meio ambiente e na vida do bairro com novas regras aprovadas e em discussão, como a Lei Complementar 232/2021, que permite a chamada reconversão de imóveis protegidos e tombados, e as mudanças propostas na atualização do Plano Diretor da cidade.
Na reunião, realizada de forma virtual, os moradores da região demonstraram preocupação principalmente com a situação da Área de Proteção Ambiental do Cosme Velho e os licenciamentos e projetos para o Largo do Boticário - que é tombado na esfera estadual, pelo Instituto Estadual do Patrimônio Cultural (INEPAC), e preservado pelo Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH).
“Estamos com muitas perguntas sem respostas”, afirmou o representante da associação de moradores Viva Cosme Velho, João Souza e Silva, ao falar das principais dúvidas que rodeiam as novas diretrizes que serão destinadas ao bairro - que tem 39 imóveis, entre tombados e preservados, contemplados pela nova lei - e os gatilhos que o futuro Plano Diretor da Cidade pode, segundo ele, “abrir para a permissão de derrubada ampla, geral e irrestrita do casario para a construção de novos imóveis multifamiliares”, afirmou. .
O Secretário Municipal de Planejamento Urbano (SMPU), Washington Fajardo, respondeu afirmando que o Plano Diretor tem a previsão de regulamentar o impacto de vizinhança do ponto de vista do Cosme Velho. "Todo trabalho é que a gente possa preservar as características do bairro, mesmo entendendo que isso produz um risco urbanístico”, afirmou o secretário, que continuou dizendo que o bairro tem características que dão feição a esse ambiente cultural, que precisa ser recuperado.
Segundo a SMPU, no novo Plano Diretor serão mantidas todas as legislações referentes à preservação ambiental e de patrimônio cultural da área - não há modificação da APA, em tombamento e preservação. O Plano também trata dos aspectos de uso para os imóveis do bairro e delibera que as peculiaridades serão consideradas, haverá restrições para o uso industrial e aos usos não residenciais. Sobre o zoneamento, as mudanças são mínimas, como a Rua Cosme Velho, que teve sua Zona Residencial Multifamiliar (ZRM) ampliada, compatível com os usos existentes.
De acordo com moradores do local, 17 meses antes da flexibilização proposta pela lei da reconversão, a reforma do casario do Largo do Boticário já estava em andamento e, atualmente, as obras estão bastante adiantadas. “A Viva Cosme Velho, que de início apoiou a reforma, agora está apreensiva. Pois, recentemente, ficou sabendo que o ‘hostel’ (que será implantado no local) terá 80 quartos e 330 camas. Fora restaurante. Ora, 80 quartos não corresponde a um edifício deitado? Que impacto o hotel provocará no bairro? Mesmo depois que os casarões já estavam vazios e abandonados, eram roteiro de discussão escolar, local de efemérides populares, recitais de corais, entre outras coisas. Esse espaço público tombado será mantido?”, perguntou o representante da Associação de moradores Viva Cosme Velho, Sr. Renato Rocha, preocupado com a mobilidade urbana do Cosme Velho e o acesso ao casarão histórico do bairro.
A Presidente do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade, Laura di Blasi, afirmou que as obras começaram durante a pandemia e o IRPH, no início, por não conseguir fazer as vistorias presenciais, que foram retomadas em fevereiro de 2021. Em abril com o aumento dos casos da Covid -19, voltaram a ser interrompidas. Em julho deste ano, as atividades foram retomadas presencialmente, mas, no final de setembro, as vistorias foram suspensas novamente, por um problema operacional da construtora, que fez a obra ser paralisada.
O Vogal da Comissão de Meio Ambiente da Câmara Municipal do Rio de Janeiro, vereador Chico Alencar (PSOL), destacou a ampla participação e o diálogo travado na audiência, e afirmou que assim se constitui uma cidade, construída por cidadãos ativos e interessados no bem comum. “Quero poder continuar entrando no Largo do Boticário, para poder admirar a beleza daquele casario restaurado e a mata atrás, pujante, rica, na sua fauna e flora. Os espaços públicos ontem e hoje precisam ser preservados”, disse Chico.
Participaram do debate também representantes da Secretaria Municipal de Meio Ambiente (SMAC), Secretaria Municipal de Desenvolvimento Econômico, Inovação e Simplificação (SMDEIS), Federação das Associações de Moradores do Rio de Janeiro (FAM-Rio), entre outros coletivos da sociedade civil.