Quase 70% das unidades de acolhimento institucional de crianças e adolescentes da cidade do Rio de Janeiro apresentam algum tipo de problema, relacionado à água e esgoto, telefonia e internet, fundações e estrutura, entre outros. Esse foi um dos dados apresentados na audiência pública realizada nesta quinta-feira (30) pela Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente da Câmara Municipal do Rio. Presidida pela vereadora Thais Ferreira (PSOL), a audiência discutiu a situação dos abrigos, com a participação de representantes do Poder Executivo, do Judiciário, Ministério Público e de outras instituições da sociedade civil, como a Rede Abrigo.
Diretor do Instituto Rede Abrigo, Douglas Lopes revelou outras informações de uma pesquisa feita em 2021 com abrigos públicos e privados. De acordo com o levantamento, 100% das instituições públicas apresentam problemas, contra 42% da esfera privada. Entre os principais estão os eletrodomésticos e eletrônicos (60,87%), portas e janelas (52,17%) e problemas elétricos (43,48%). O item saúde é também um grave problema enfrentado pelas unidades. Em 50% delas foram colhidos relatos de que não conseguiram buscar tratamentos para os abrigados, principalmente com profissionais especializados, como fisioterapeutas, psicoterapeutas e dentistas; 65% tiveram dificuldade para obter medicamentos.
A pesquisa ainda revelou que 79,86% dos acolhidos na cidade do Rio de Janeiro são negros, 86% vêm das favelas e 55% são originários da Zona Oeste o que, na visão de Lopes, pode ser delicado quando há uma transferência de abrigados de uma região para outra. “No segundo semestre de 2021, vimos a unidade Ana Carolina, que funcionava em Ramos, ser colocada no Espaço Cazuza, em Laranjeiras, com a unidade Bia Bedran. Territorialmente, é complicado e desrespeitoso tirar abrigados da Zona Norte para a Zona Sul”, observou. Lopes defende a manutenção dos acolhidos próximos aos seus locais de origem e suas famílias.
A promotora Patrícia Hauer Duncan, titular da 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva da Infância da Capital do Ministério Público do Rio de Janeiro, defendeu também a questão da territorialidade na distribuição dos abrigos e da não separação de irmãos. “Muitos meninos e meninas são oriundos da Zona Oeste e da Zona Norte. É importante que haja acolhimentos nestes lugares para que as crianças possam ser mantidas perto de suas residências, e não podemos permitir que irmãos sejam afastados por questões burocráticas”, acentuou.
Egresso do acolhimento, Lucas Rodrigues ressaltou as dificuldades dos abrigos e ressaltou a importância das parcerias. “A Assistência Social não consegue dar conta de tanta demanda. Precisamos do envolvimento de outras secretarias, como a da Educação e Saúde”. Já a subsecretária de Proteção Social Especial da Secretaria Municipal de Assistência Social, Sheila Maria de Oliveira, que representou a secretária Maria Domingas Pucu, falou sobre a atuação do corpo técnico da pasta. “É um grande desafio fazer gestão da política de assistência social na cidade do Rio de Rio, que é uma megalópole, e fazer uso de pesquisas, como a da Rede de Abrigos, é fundamental para direcionar melhor o trabalho”.
Para a vereadora Thais Ferreira, há um acúmulo histórico em relação à vulnerabilidade das crianças e dos adolescentes brasileiros, e é preciso atendê-los com urgência. “Essa excepcionalidade, que é caso das crianças desabrigadas, precisa ser tratada com responsabilidade e prioridade por todas as pessoas. O tempo da política não é o tempo da criança. Nesse minuto e em outras horas que seguirão no nosso dia teremos crianças na cidade do Rio de Janeiro sendo violadas em todos os seus direitos fundamentais. Sem o atendimento, sem as respostas e as cobranças devidas não vamos chegar ao caminho que de fato garante que toda criança seja respeitada como um sujeito integral de direitos”, concluiu.
Participaram também da audiência pública o vereador Jair da Mendes Gomes (PROS), vice-presidente da Comissão dos Direitos da Criança e do Adolescente, as vereadoras Laura Carneiro (PSD) e Teresa Bergher (Cidadania), a defensora pública Eufrásia Maria Souza e a juíza de direito Lúcia Glioche.